sábado, 29 de maio de 2010

Terapia Compressiva

As feridas crónicas são um problema de saúde pública que envolve elevados custos para o S.N.S e para o cliente. De entre as feridas crónicas, as úlceras da perna são as que apresentam maior prevalência, e com base num estudo nacional esse valor é de 1,41 para cada 1000 habitantes (Pina e colegas, 2004).

As úlceras da perna têm um enorme impacto em vários aspectos da vida do cliente: físicas, psicológicas e sociais realçando a dor, e o isolamento social pelo odor. A não evolução tanto do processo cicatricial como do impacto desejado na qualidade de vida dos clientes, conduzia frequentemente ao abandono dos tratamentos, tornando-se uma situação crónica.

Em 2001, a Terapia Compressiva foi considerada por Cullum “essencial para melhorar as taxas de cicatrização nas úlceras de perna de origem venosa”. A Terapia Compressiva é aplicada para que a pressão sub-ligadura seja mais elevada no tornozelo e menor no joelho, de forma a empurrar o sangue das pernas no sentido ascendente para o coração. Tem como efeitos a compressão das veias e torna as válvulas mais capazes de fechar; aumenta a velocidade do fluxo venoso reduzindo a congestão capilar. Esta redução significa que mais fluidos podem ser comprimidos dos tecidos para as veias reduzindo o edema; a diminuição da pressão venosa e o aumento da velocidade do sangue assegura que mais nutrientes cheguem aos tecidos (há uma redução da secura e a elasticidade da pele é restaurada).

Foram entrevistados alguns clientes que se encontram a fazer tratamento com a Terapia Compressiva na ULS da Guarda, E.P.E – Centro de Saúde da Guarda. Segue-se agora o relato dessas opiniões.

Júlio tem 48 anos e lesões em ambos os membros inferiores resultantes de lesões traumáticas de há dez anos. Foi onze vezes intervencionado no bloco operatório e por se sentir desmotivado pela estagnação do seu estado faltava regularmente às marcações para tratamento em Centro de Saúde, fazendo ele próprio o tratamento em casa. Júlio já se tinha mentalizado que a única solução seria a amputação de ambos os membros. Sentia vergonha de sair pois o cheiro incomodava as outras pessoas, interferindo com a sua vida social. Iniciou tratamento através da Terapia Compressiva há cerca de três meses apresentando inicialmente uma lesão com vinte e dois centímetros (cm) de comprimento e cinco cm de largura; ao fim de dois meses e meio de tratamento, a lesão diminuiu para sete cm de comprimento e um cm de largura. Faz um único tratamento semanal, sendo um cliente assíduo. Quando questionado sobre o que valoriza mais no tratamento responde: “As melhoras são visíveis de semana para semana, dado à eficácia do tratamento e do acolhimento. As minhas pernas estão menos inchadas, as feridas muito mais limpas e mais pequenas.” Júlio faz o tratamento sempre com a mesma Enfermeira, permitindo uma total continuidade de cuidados. Actualmente, está confiante quanto à sua recuperação total.

Joaquim, 72 anos, apresentava uma úlcera venosa há cerca de um ano e meio. Segundo o cliente: “Se não tivesse a fazer este tratamento ainda tinha a ferida”. Antes de iniciar tratamento com Terapia Compressiva tentou vários tratamentos e consultou um cirurgião. Iniciou terapia compressiva há seis meses encontrando-se a úlcera encerrada a cerca de dois meses. Mantém visitas semanais ao Centro de Saúde unicamente para controlar o edema. Joaquim refere que o que mais valoriza é o encerramento da úlcera, referindo ainda dificuldade em aplicar e manter meias terapêuticas, sendo este o motivo para ainda manter a Terapia Compressiva com ligaduras.

Por fim, foi entrevistado Celestino, cliente de 70 anos com úlceras venosas em ambos os membros. Quando questionado sobre os anos das úlceras, respondeu com um sorriso “Já nem me lembro bem, há dezanove anos! Este tratamento foi o que me valeu!”. Celestino não acreditava na cura, tendo muito medo da amputação. Deixou de ter vida social por ter complexos relativos ao odor da ferida que incomodava os outros. Tomava cerca de vinte comprimidos por dia, tendo sido internado algumas vezes, apresentando já multi-resistências a antibióticos. Referiu ainda que chegou a ter “bichos nas feridas”. Actualmente faz tratamento com terapia compressiva há um ano. Iniciou o tratamento com três visitas semanais, sendo necessário neste momento, apenas um tratamento semanal. Com a Terapia Compressiva abandonou os antibióticos e os analgésicos. Refere que o que mais valoriza é “o aspecto da ferida”, a cicatrização e evolução das úlceras.

Segundo um estudo realizado no Centro de Saúde da Guarda, após a implementação da Terapia Compressiva houve uma redução de custos em pensos terapêuticos de 51% de 2007 para 2008. Ainda de referir do mesmo estudo, numa amostra de 42 indivíduos, com uma idade média da ferida de 26,99 meses, em 88,1% dos casos, houve cicatrização da ferida, registando-se um único abandono do tratamento. Houve ainda três casos de recidivas, número reduzido tendo em conta o tipo de feridas de que falamos. Este estudo mostra a eficácia do tratamento.

A Terapia Compressiva tem como objectivo a cicatrização de úlceras e a não recidiva das mesmas, mas acima de tudo o aumento de qualidade de vida dos clientes. Com este artigo, pretendemos incentivar os leitores a abrir novos horizontes ao tratamento das úlceras das pernas e a incentivar a aplicação deste tipo de tratamento que já é notória a sua eficácia.

Enf.ª Cremilda Almeida
Enfermeira da ULS Guarda, E.P.E.
- CS da Guarda

Enf.ª Cristina Fernandes

Enf.ª Raquel Costa

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